E somos capazes de nos habituar, de fixar o olhar noutro lugar.

Deus habita entre nós. Fez-se homem, como tu e eu, pisou a mesma terra, trabalhou, amou com coração humano.

Só podemos maravilhar-nos ao contemplar, no presépio, a simplicidade de um Menino que é Deus. E a grandeza de um Deus que, por amor, se despojou de toda a realeza.

É espantoso. É sempre novo. Hoje e cada dia.

Um Santo Natal.

Vens hoje, Jesus.

Não ligues à desarrumação. Demos um jeito no que pudemos, mas o lugar não é o que queríamos preparar para um rei.

Vai estar pouca gente. Devem aparecer alguns pastores e as crianças da aldeia. Parou aqui uma estrela e pode ser que traga uns estrangeiros.

Está frio. Temos uns paninhos e palha, muita palha. Não há de faltar nada.

Pode não parecer, Jesus, mas queremos muito que venhas. Isto contigo é tão diferente! Até já.

Mesmo tendo tudo atrasado e muito que fazer, mesmo sabendo que leva tempo, mesmo que não seja necessário.

Assim como te vestes bem e preparas a casa para a chegada do Menino, queres ter limpa a tua alma para que Ele a encontre o melhor possível.

Como Maria preparou, tanto quanto podia, aquele estábulo que Jesus fez brilhar.

O brilho é Dele. Mas como fica bem na tua alma transparente, que O acolhe e entrega aos outros.

Um tempo alegre e sereno, com boas conversas, em que o que sentimos de bom uns pelos outros se diz sem pudor. Um bom jantar, com bom vinho e boas sobremesas. Os presentes certos, o coração aquecido, a família em paz.

Mas, às vezes, o jantar é uma seca. Não tens conversa para a família que nunca vês. Está um frio glaciar, não gostas de bacalhau e recebes a caixa de bombons que tinhas oferecido no Natal anterior. Passaste horas em filas e na cozinha, a mesa das crianças está impossível e só queres que o Natal acabe.

Se esperares dos dias de Natal um tempo simples em conversa com o Menino Jesus; se tentares renovar a tua entrega ao Deus que se entregou; se alimentares a tua relação com Deus olhando para o presépio; então, terás mais motivos para fazer do Natal um momento especial; e mais razões para sorrir se a festa for uma desilusão.

Estás sempre a contar o que mereces. Se és generoso na oração, exiges que Deus te ouça. Se fazes um gesto de caridade, exiges que o façam a ti. Se estás mal disposto, exiges que estejam todos. Se serves, exiges que te sirvam. Se te esforçaste, exiges reconhecimento. Tens sempre que receber em troca.

Então?! Não tinhas escolhido viver por amor?

Não faças contas.

Tu, que podias estar à frente de obras apostólicas? Tu, que fazes coisas importantes? Tu, que és procurado pela multidão? Tu, que dás tanto fruto?

Tens agora que largar tudo isso para ocupar-te em tarefas domésticas? Largar tanto fruto para cuidar de velhos e doentes? Largar um trabalho prestigiado para servir os últimos? Largar o que te faz brilhar para viver escondido?

Se é o que te pedem agora, é o que deves fazer. Virá mais fruto dessa entrega, que de todo o alarido que existe à tua volta.

Não sejas convencido, não és mais digno que ninguém. E se o bem que fazes tem que ser visível, não o fazes assim tão bem.

Tudo nos lembra Jesus, tudo nos fala do acontecimento mais espantoso da história: Deus faz-se homem.

Até as figurinhas de barro, deformadas, que existem em todas as casas e não se parecem nada com ovelhas, nos ajudam a rezar.

A época é ternurenta e o coração está bem disposto: que tudo te leve a dizer algo ao Menino Deus. Os presépios, as árvores, as estrelas, a neve, o bacalhau, as promoções... E assim, também o que não fala de Jesus te serve para falares com Ele.

Prepara-Lhe um lugar. Está quase.

Já estavas farto da conversa e sem cabeça para responder. Depois de algum tempo, acabaste por reagir com um emoji sorridente. Do lado de lá, alguém ficou descansado, pensando que rias à gargalhada.

Também já tiveste reações sinceras. E também já estiveste do outro lado a receber o consolo de um emoji, de alguém que te apoiou, ou que amou o que disseste, ou que achou graça, ou que, simplesmente, te despachou. É que não dá para saber.

Por isso, não importa assim tanto manter essa imensa rede de conhecidos e seguidos. Se for caridade, manda lá o boneco! Mas dá mais tempo àqueles com quem consegues estar. Os que podes consolar olhos nos olhos. Não com máscaras.

Acreditas mesmo que Deus não existe? Ou não te deste ao trabalho de pensar? É uma convicção ou uma ideia que te dá jeito?

É que não é uma posição fácil de defender, se tens um mínimo de honestidade. Mas talvez não te apercebas se és ateu por achar mais confortável.

Nem farás um bom serviço aos que, igualmente descrentes, movem montanhas em busca de um sentido.

Procura, pensa, estuda. Ainda que acabes na mesma, talvez então se consiga conversar contigo.

Enquanto esperas o autocarro, perdes-te no telemóvel ou lês? Enquanto esperas uma resposta, perdes o tempo ou começas a trabalhar noutra coisa? Enquanto esperas pelo sono, soltas a imaginação ou rezas? Enquanto esperas uma chamada, tens o telefone longe ou perto? Enquanto esperas o momento certo, estás distraído ou atento? Enquanto esperas um convidado, destróis ou arrumas a casa?

Enquanto esperas, vives de tédio ou de esperança?

E agora que esperas Jesus, por que estás tão longe? O que podes ler? O que podes rezar? O que podes tentar? O que podes corrigir?

Ativa o Advento!

Mas é a que há!

Às vezes podes comer o que gostas. Outras vezes deves comer o que alguém fez, o que outros gostam, o que for mais barato. E, se sobrar, ainda repetes no dia seguinte.

Tens muitos caprichos em casa. Mas era em casa -onde és chamado a servir primeiro- que devias ter menos.

Podes perfeitamente passar um dia sem as tuas coisinhas preferidas. Não faças birras: come. Se não te faz mal, só te faz é bem!

Estás preso nas redes há horas. O isco foi um algoritmo que parece conhecer-te melhor do que tu e te apresentou exatamente o que desejavas.

Depois foi-te mostrando mais coisas apetitosas: uma piada, um corpo perfeito, um gesto satisfatório, uma frase escandalosa, uma coisa barata, um elogio...

Não dás pelo tempo a passar, não queres saber quanto passou. Há uma leve censura, escondida na consciência atrás de um meme, a sugerir que essa perda de tempo te está a fazer mal. Que está a tirar lugar a coisas melhores, que está a dominar a tua vontade, o teu auto-controlo, a tua capacidade de trabalho, a tua entrega aos outros, o teu sono, a tua sede de contemplação.

O mar é muito grande. Se não reages com força, ficarás confinado a essa apertada rede, sem nada que te distinga de outros peixes. E com a inteligência e vontade de um deles.

És intolerante. Desprezas ou tratas mal quem erra. E sempre que te acusam, dizes que tens o dever de defender a verdade.

Certo, tens esse dever. Mas ele não te desculpa.

Podes defender a verdade com caridade. Podes defender a verdade defendendo também as pessoas.

Não é fraqueza, nem tibieza. É uma manifestação de amor. Se não tens vontade de lavar os pés a quem erra, não te armes em guardião do verdadeiro catolicismo.

Já tentei tanto. Já falhei tanto. Ainda serei capaz? Ainda vale a pena?

Parecia que estava perto e... outro trambolhão. Pensava que tinha conseguido, que estava conquistado, que agora seria fácil. E, afinal, a mesma fraqueza, o mesmo desamor.

Não posso mais, não sei outros truques, não tenho mais soluções. Mas Tu podes. E mesmo que não o sinta, sei que vale a pena.

Obrigado Jesus por me lembrares que não sou capaz de nada quando largo a tua mão. Perdoa-me. Eu sei que me queres livre, mas, quando me vires fugir, por favor, puxa-me com força.

Foi um elogio, ficaste contente. Mas devias, pelo menos, desconfiar. Não de quem o disse, mas de ti próprio.

Talvez te estivesse a comparar com uma imagem preconcebida e irreal dos católicos. Ou então, com aqueles católicos que dizem coisas que custa ouvir.

E, neste caso, será que é bom ser diferente dos outros? Deixas para eles a parte difícil e ficas com os louros? Deixas para eles a verdade enquanto te limitas a repetir generalidades?

Não te queiras destacar. Se estás na verdade, que não te preocupe ser como os outros. Queima-te.

Posts mais antigos